quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

TRATADO DE TORDESILHAS


O Tratado de Tordesilhas
A descoberta da América em 1492 e a do Brasil em 1500 inserem-se no ciclo das navegações em busca do melhor caminho para as Índias. Eram os tempos modernos que se iniciavam com um movimento geral de renovação, o Renascimento, caracterizado pelo espírito mais aberto e crítico do humanismo, o maior conhecimento da antigüidade clássica, grande surto das artes e o desenvolvimento das ciências, inclusive as que se relacionavam com a arte de navegar. A carência dos metais preciosos na Europa, a sede de especiarias e os mitos então correntes sobre as riquezas do Oriente impulsaram portugueses e espanhóis a procurar novas terras, avançando sobre mares desconhecidos. Os primeiros o fizeram sistematicamente, contornando primeiro toda a África; os segundos, de maneira quase surpresiva, ante o êxito da viagem de Colombo.
Portugal e Espanha, empenhados, assim, em atividades exploratórias, comerciais e colonizadoras cada vez mais arrojadas, cedo verificaram serem conflitantes seus interesses. Procuraram, portanto, garantir terras e ilhas descobertas ou por descobrir, recorrendo ao árbitrio da Cristandade a quem se reconhecia, então, não só a supremacia espiritual mas também um direito temporal universal que incluía a livre disposição de territórios não sujeitos a príncipes cristãos.

J. Van Kessel, Alegoria brasileira, Museu F. Mayer, Cidade do México.
A Corte de Lisboa havia já obtido, por bulas de vários pontífices, amplas prerrogativas e mesmo a confirmação do domínio sobre ilhas e portos descobertos e por descobrir na costa da África e na restante rota para as Índias. Os Reis Católicos, após a viagem de Colombo, recorreram ao também espanhol Alexandre VI e dele obtiveram vários privilégios, alguns dos quais colidiam com as anteriores concessões aos portugueses. Para equilibrá-los, resolveu o Pontífice, a 4 de maio de 1493, pela bula intercoetera ou da partição, dividir as concessões espanholas das portuguesas através de uma linha ou meridiano de pólo a pólo, a cem léguas das Ilhas dos Açores e Cabo Verde, passando a pertencer o que dessa linha ficasse para o oriente às conquistas de Portugal e para o poente às da Espanha. Esta concessão não foi naturalmente do agrado do Governo de Lisboa, que contra ela protestou.
Celebrou-se, então, entre os dois monarcas, em Tordesilhas, o Tratado de 7 de junho de 1494, que estipulou que a linha estabelecida pelo Sumo Pontífice se suporia traçada a 370 léguas para o poente das referidas ilhas, ampliando-se, assim, a favor de Portugal, as 100 léguas antes consagradas. Apesar, porém, de prevista no Tratado, nunca se realizou a demarcação das 370 léguas, obrigação prorrogada e definitivamente esquecida pelas duas Coroas. O meridiano de Tordesilhas, apesar de nunca demarcado e de ser de impossível localização no interior do país, passaria ao norte em Belém do Pará e no sul em Laguna, Santa Catarina.
Apesar das compreensíveis dificuldades, conseguiram os luso-brasileiros fixar-se nas costas do Brasil desde o Oiapoque, ao norte, à baía de Paranaguá, em Santa Catarina, ao sul.
O embaixador Synésio Sampaio Góes, em seu livro Navegantes, Bandeirantes, Diplomatas (FUNAG, IPRI, Brasília, 1991, pp. 9 e 10) sintetiza, com felicidade, a penetração dos luso-brasileiros muito além da linha das Tordesilhas:
"No fim do séc. XVI surgiu, entretanto, um fenômeno histórico, diverso: um conjunto denso de ações de penetração territorial, com origem num único local, objetivo predominante de caça ao índio e que desrespeitava com freqüência a demarcação de Tordesilhas. Bandeirismo chama-se esse movimento, que cria na cidade de São Paulo, aproximadamente entre 1580 e 1730, uma sociedade de características especiais (...)

Sérgio Ferro, projeto para o painel "Bandeirantes".
De outro ponto do território, Belém fundada em 1616, subindo o rio Amazonas e seus afluentes, outros homens, mestiços de índios em sua maioria, como em São Paulo, e com os mesmos objetivos econômicos, também foram se apossando de lugares que deveriam ser espanhóis pela partilha de 1494. Pedro Teixeira, em 1642, teria chegado a fundar uma povoação, Franciscana, em pleno equador atual; mas a fronteira acabou se fixando mais a leste na boca do rio Javari. Na margem norte do Amazonas os luso-brasileiros foram subindo os rios Negro e Branco, até quase suas nascentes; na margem sul subiram os compridos rios Madeira, Purus e Juruá, até onde puderam. E, assim já nas primeiras décadas do séc. XVIII, tinham completado o feito excepcional de ocupar os pontos estratégicos da imensa bacia amazônica.
Em 1718, bandeirantes de São Paulo descobriram ouro em Cuiabá. Para manter contato com essa área longínqua estabeleceu-se um sistema de transporte através de rios que é uma das originalidades da história do Brasil, as "monções". Eram comboios de canoas que, por mais de cento e cinqüenta anos, ligaram São Paulo aos centros mineradores do oeste. Dessas minas, o movimento expansionista atravessou o então chamado "mato grosso do rio Jauru" (que deu nome ao futuro estado) e atingia as margens do Guaporé, onde novas minas foram descobertas em 1734: da bacia do Prata os bandeirantes paulistas passaram à do Amazonas. Em pouco tempo estabeleceu-se a ligação com Belém, pelo rio Madeira, também por comboios de canoas, as "monções do norte". Com elas, os dois movimentos de penetração se encontravam: era a ligação entre os estados do Brasil e do Maranhão que afinal se estabelecia (...)
De ambas as penetrações, a pé e depois em canoas a partir de São Paulo, sempre em canoas a partir de Belém, resultou o acontecimento fundamental do período colonial: a dilatação do território brasileiro muito além de Tordesilhas".
Fonte: www2.mre.gov.br

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